quinta-feira, 15 de abril de 2010

Outro lado


OUTRO LADO
Ronie Von Rosa Martins



Estavam todos. Como o dele. Ali. Pendurados-encravados-talhados na parede. Mesmos e iguais de olhos bocas e sorrisos tantos.

Tolas. E sorriam com dentes de argila e cimento. O sorriso coletivo pedia o dele. Ali também. Troféu.

E a parede ofegava. Arfava de emoção que estava e era.

Comer com dentes a carne singular e defecar pelos poros de sua instancia o rosto reconduzido, reformado. Emoldurado no senso; comum a todos.

Alisas todas as arestas. Moldado rosto. Formatado rosto. A cara de todos um.

E era o muro. E apertava a carne. Prosaica serpente. Muro. Murro na cara. Várias, tantos quanto necessário ao processo de docilização-domesticação-castração.

E eram as bocas todas que cantarolavam inocentes pequenos versos morais. Entre tremores labiais. A conformação do riso. Deterioração do ser riso.

Comprometidas visões. Parciais. Caricaturais.

Subtrair a carne. Arrancar o rosto. A cara. Do muro. Em urro em berro em dor. Subtrair o corpo da clausura. Furo, brecha, rachadura, fissura, fenda. Senda de possibilidades todas.

Diferença. Além da crença do rito do grito.

Pela fresta, buraco, vago, espaço da cabeça que não está. Esbraveja a criatura-muro, o poder se esvaindo no espaço que abraça o além do amém. Amem a segurança da pedra! Vocifera a fera. Amem o abraço da pedra. O afago da pedra. O carinho da pedra. Voltem pra caverna! Esconjurem Platão e toda ilusão!

Mas o corpo-carne-cara dele em pés e braços e pernas tantas e todas; novo corpo desgovernável parido pelo espaço que se produz na rua ganha todos os passos.

Impura rua além do muro. A antítese do muro corre, foge e luta. Em marcha que se distende, corpo que se pretende-lágrima que se desprende.

Mas eis que das outras caras todas. Seguras na estrutura ecoam. Profundas canções. Graves acusações.

“Tu! Tu! E salivavam conformidades ofendidas, seguranças ameaçadas. Cuspe. Argilosa baba.

“Tu! Tu! Móbil criatura. Nua criatura. Carne pura! Morre! No gesso do meu catarro!

Morre em estátua crua!

Morre em estátua crua!!

Te junta. Dissolve. Transforma. Volte ao barro-greda-argila-cimento-grade. Abandona a carne. Abraça a fome do muro. Ouve o murmúrio. Ouve o murmúrio!!! O murmúrio do tijolo. Ouça a sinfonia, o encanto, a poesia... O discurso do muro!

A antítese resiste. Osso-pele-poro-suor e dor. Solto. Salta, pula e escolhe a fresta-frincha espaço e mergulha. Agulha que trespassa. Trapaça a tessitura do muro. Agulha sem linha – só a de fuga.

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